Música

Anacleto de Medeiro, o primeiro maestro da banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro

por Mila Ramos

sexta, 13 de julho de 2018

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Considerado um dos maiores compositores da nossa história, o dia 13 de julho marca o nascimento do maestro, compositor e instrumentista Anacleto de Medeiros, primeiro maestro da banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. Suas composições destinadas ao repertório bandista são bastante ricas e diversificadas. A obra de Anacleto revela a diversidade de experiências culturais e musicais pelas quais passa o Rio de Janeiro, capital do Brasil, entre o fim do século XIX e início do XX. Nesse universo de diálogos intertextuais e fusões, as bandas têm papel de fundamental importância, até o início do século XX pode ser medido pelo papel que desempenham na profissionalização do músico, tanto nos grandes centros urbanos como nas pequenas e médias cidades, e também no pioneirismo nas gravações dos primeiros fonogramas. Vive-se nesse período de passagem dos séculos uma espécie de "era das bandas". E Anacleto de Medeiros se realiza antes de tudo como líder de banda e assim se destaca.

A constituição e renovação de acervos é hoje uma das maiores dificuldades que instituições culturais enfrentam. Essa memória viva se tornou acessível ao público graças ao projeto PRINCÍPIOS DO CHORO, esforço realizado pela Petrobras Música em 2001, com a parceria do Instituto Moreira Salles, em sua exemplar experiência e suas instalações construídas especialmente para abrigar física e virtualmente o acervo e desenvolvido na gravadora Sarapuí e seu jovem selo Biscoito Fino. Um lindo trabalho de pesquisa, restauração, digitalização e realização desses CDs em cinco volumes, cada uma delas com três CDs diferentes, reunindo 215 choros e contando um pouco da memória do principal e mais brasileiro dos gêneros musicais.

Não há memória brasileira sem a música, não há música brasileira sem o choro, por isso, em homenagem a Anacleto de Medeiros, extraímos o texto do encarte do quarto volume, onde ele aparece no CD 10 ao lado de Joaquim dos Passos Barroso e Eurico Batista.

Boa leitura!

Fonte da imagem: Capa, Contracapa e CD 10 da coleção PRINCÍPIOS DO CHORO VOLUME 4


| ANACLETO DE MEDEIROS | 1866 - 1907 |

Anacleto Augusto de Medeiros foi um dos maiores compositores de choro de todos os tempos. Nasceu em Paquetá, RJ, filho natural de uma escrava liberta. Começou a estudar música aos nove anos de idade na Banda do Arsenal de Guerra do Rio de Janeiro com o maestro Antônio dos SantosBocot. Trabalhando como tipógrafo, ingressou no Conservatório de Música e se formou em 1886, tendo sido contemporâneo de Francisco Braga. Já então tocava vários instrumentos de sopro. Passou a se dedicar à composição e à organização de conjuntos instrumentais como o Clube Musical Gutemberg e a Banda da Sociedade Recreio Musical Paquetaense.

Aos trinta anos de idade Anacleto já era conhecido como regente e compositor quando foi convidado para organizar a Banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. Reuniu antigos colegas da Banda do Arsenal de Guerra, integrantes da Banda de Paquetá e seus companheiros de choro, compondo a melhor banda da cidade. Sob sua direção, a Banda do Corpo de Bombeiros ficou famosa ao participar das primeiras gravações feitas no Brasil para a Casa Edison em 1902.

A música de Anacleto inspirou vários compositores, que fizeram uso de seus temas na criação de obras de concerto. Villa-Lobos na série Choros e Radamés Gnattali no 3º movimento da SuíteRetratos são exemplos que confirmam a importância de Anacleto de Medeiros para a música brasileira.

Anacleto de Medeiros – [...] morava na rua da Ajuda com o inesquecível humorista Moreira da Imprensa Nacional, muito conhecido dos chorões daquele tempo pela sua serve espiritual. Era o maestro que aproveitava as melodias dos pássaros, dos apitos das fábricas, das cornetas dos tripeiros, do badalar dos sinos, dos toques das buzinas, dos automóveis, do trinar dos apitos dos guardas-noturnos, e de tudo que formasse uma nota boa ou semitonada. Por ele eram todos os ritmos aproveitados para as suas sublimes composições. Anacleto, foi um grade lecionador de música, assim como um mestre de muitas bandas particulares deixando muitos discípulos que fizeram honra a seus dotes de professor exímio.

Como mestre de Banda do Corpo de Bombeiros ele imortalizou-se, com a sua inteligência, e devotamento, trabalhou corrigindo, modelando e aperfeiçoando, todos os seus comandados com a magia de uma grande vara usada por ele nos ensaios a guisa de batuta que fazia obedecer os seus alunos. Como maestro ensaiador transformou a Banda do Corpo de Bombeiros em um conjunto de músicos professores que o respeitavam e o obedeciam, na maior rispidez de suas energias, pois Anacleto, era um diretor de música caprichoso e violento. Porém, quando não tinha na mão a batuta era um cordeiro de mansidão. Era uma pomba sem fel e um sincero amigo dos seus subordinados. Privando com eles na maior intimidade no mesmo nível de igualdade os acompanhando para o choro onde sobressaia com um inigualável executor no seu saxofone que era o seu instrumento predileto.

Os choros organizados por Anacleto faziam falar os mudos e movimentava os paralíticos, desatinava a mocidade e trazia a juventude nos corações dos velhos. As composições musicais de Anacleto são conquistadas e admiradas por todos os chorões, composições estas que deixo de enumera-las aqui por serem todas elas conhecidas pelos chorões da velha guarda.” (“O Animal”)


Fonte da pesquisa

1. PINTO, Alexandre Gonçalves. O Choro — reminiscências dos chorões antigos. 2ª ed. Rio de Janeiro: Funarte, 1978. (p.57, 60, 75) 
2. VASCONCELOS, Ary. Panorama da música popular brasileira na Belle Époque. Rio de Janeiro: Livraria Santana Ltda., 1977. 
3. ENCICLOPÉDIA DA MÚSICA BRASILEIRA: POPULAR, ERUDITA E FOLCLÓRICA. São Paulo: Art Editora/Publifolha, 1998. 
ANACLETO de Medeiros. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2018. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa12241/anacleto-de-medeiros>. Acesso em: 13 de Jul. 2018. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7



Mila Ramos é fascinada por música e foi em seu trabalho com bandas cover em 2012 que encontrou uma nova paixão: o Music Business. Especializou-se em Marketing e Design Digital pela ESPM-RJ e somou seus conhecimentos ao mundo musical como Produtora Artística. Em 2017, entrou para o Instituto Memória Musical Brasileira (IMMuB). Lá chegou ao cargo de Coordenadora de Comunicação e, sob sua gestão, conquistaram o Prêmio Profissionais da Música 2019, e o Programa Aprendiz esteve entre os finalistas de 2021.


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