Música e Direito

Obra, Fonograma, titulares de direitos e cadastros

Passos para receber o direito autoral

quinta, 17 de janeiro de 2019

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Como mencionado no primeiro texto, nessa segunda colaboração abordaremos a importância do cadastro das obras musicais e fonogramas para os titulares de direitos a eles relacionados.

Porém, antes de falarmos especificamente dos cadastros, é importante apresentarmos algumas definições necessárias a uma melhor compreensão do assunto que será tratado, como: (1) o que é a obra musical; (2) o que é o fonograma; (3) quem são os titulares de direito da obra e do fonograma; (4) qual a forma de remuneração de cada titular de direito; e (5) qual a diferença de registro e cadastro no mundo do direito autoral.

O que é obra musical?

Quando uma música é escrita, seja por uma ou mais pessoas, seja com letra e melodia ou somente com melodia se cria uma obra musical e os direitos relacionados a ela são os chamados direitos de autor ou direito autoral.

Podemos consumir uma obra musical de duas formas: ao vivo ou por meio de uma gravação, essa última é o que chamamos de fonograma, sendo os direitos relacionados ao fonograma chamados de direitos conexos ou artísticos.

O que é fonograma?

O fonograma é a fixação sonora da interpretação de uma obra musical em qualquer tipo de suporte material, como em uma faixa de um CD ou em um arquivo no formato mp3, por exemplo. Podemos dizer que é a gravação da obra musical e que todas as músicas que ouvimos em rádios, cinema, TV, em CDs e em serviços de streaming são geradas de um fonograma.

Com isso, podemos compreender que uma mesma obra musical pode ser interpretada por diferentes artistas, de diversas formas e gravada de várias formas diferentes, logo, podemos ter diversos fonogramas de uma única obra musical.

Exemplificando: Yesterday, composta por Paul McCartney, é considerada a obra mais regravada da história superando 3.000 gravações (fonogramas), de diversos artistas por todo o planeta, Em segundo lugar está Garota de Ipanema, de Tom Jobim.

Diferenciada obra de fonograma, é importante sabermos quem são os titulares do direito autoral, dos direitos conexos e como é remuneração da utilização de um fonograma.

Quem são os titulares de direitos?

A utilização da obra gera rendimentos para o autor, versionista e editora (se houver) em percentuais variáveis livremente ajustados entre as partes. Por exemplo, Marcos e Jorge criaram a obra denominada “Impressão” em coautoria e estipularam, em comum acordo, que Marcos é autor de 70% da obra enquanto Jorge é de 30%.

Destaca-se que, do valor arrecadado por um fonograma, 2/3 são destinados aos titulares de direito autoral, tendo em vista que sem obra não haveria fonograma. O restante do valor, 1/3 é destinado aos titulares do fonograma, no qual as funções e titulares são:

Intérprete: é o artista que interpreta a obra. O fato de se apresentar ao público e, por vezes, tornar-se conhecido por sua técnica musical, carisma traz extrema importância à sua função, gerando mais execuções do fonograma, que leva a arrecadar mais direitos autorais. O intérprete recebe 41,7% dos valores arrecadados.

Músico: pode ser Músico Acompanhante ou Músico Arranjador. Pode haver um ou mais músicos em um fonograma. Podem ser os instrumentistas, backing vocal etc. Os participantes desta categoria recebem 16,6% dos valores arrecadados.

Produtor Fonográfico: é a pessoa, física ou jurídica, responsável pela gravação do fonograma. É o responsável pelo financiamento e o cadastro do fonograma na associação que integra o ECAD. Produtor Fonográfico pode ser uma pessoa ou uma gravadora e pode haver um ou mais. Assim como o intérprete, recebe 41,7% dos valores arrecadados.

Importante: produtor fonográfico é o produtor musical? Não. Não se deve confundir produtor fonográfico com produtor musical. O primeiro é o responsável econômico pela geração do produto fonográfico e tem os direitos do fonograma, como o direito de distribuição, reprodução e venda, por exemplo. É o produtor fonográfico o responsável pelo cadastro do fonograma e pela geração do ISRC (international standard recording code), que falaremos mais a frente.

O produtor musical, geralmente é a pessoa física, que trabalha na produção e gravação de um single, EP, álbum, por exemplo. A sua função é auxiliar na produção musical, supervisionando as etapas de pré-produção, gravação, mixagem e masterização. O produtor musical pode ser o produtor fonográfico, mas isso não é obrigatório, podendo ser acordado de acordo com o interesse dos artistas envolvidos.

O quadro abaixo demonstra, de forma resumida, os titulares de direitos da obra e fonograma: 

Obra

Fonograma

Direito autoral

Direitos conexos

Compositor/Autor, Versionista e Editora

Intérprete, Músico e Produtor Fonográfico

Percentuais variáveis

(livremente acordado entre as partes)

Percentuais fixos: Intérprete(s) (41,7%), Músico(s) (16,6%) e Produtor(es) Fonográfico(s) (41,7%)


É importante distinguir a autoria da titularidade de direitos para que se compreenda o papel da editora e do produtor fonográfico no quadro acima. A autoria diz respeito, a existência de uma relação intrínseca do autor com a obra criada, enquanto a titularidade diz respeito ao exercício efetivo do direito da propriedade intelectual.

O autor de uma obra musical sempre será o seu criador, porém, nem sempre o autor será o titular dos direitos patrimoniais da sua obra. Isto porque, embora não seja obrigatório, o autor pode transferir, por meio de contrato, a titularidade do direito patrimonial sobre a sua obra para uma editora, que passará a ter a titularidade derivada dos direitos daquela obra.

Com isso, a editora passará a ser a responsável pelo cadastro da obra no ECAD, como veremos mais adiante. 

O mesmo acontece no fonograma, no qual o produtor fonográfico recebe por contrato os direitos conexos dos demais titulares do fonograma, como músicos e intérpretes, sendo o titular dos direitos do fonograma.

Atenção: Registro e Cadastro são diferentes

A última consideração conceitual, mas não menos importante é a distinção entre registro e cadastro. Embora possam ser entendidos como sinônimos em praticamente todas as situações da língua portuguesa, no direito autoral essas palavras tratam situações distintas.

O registro pode ser feito para composições musicais, letras, partituras de músicas e arranjos musicais na Biblioteca Nacional ou na Escola de Música da UFRJ e serve como indício de prova de autoria, bem como para especificar o(s) autor(es), especificar os direitos morais e patrimoniais da obra musical e estabelecer a duração dos prazos de proteção da obra para o(s) autor(es) e seu(s)s sucessor(es).

É importante deixar claro que o direito autoral do criador sobre a sua obra não depende do registro nem do cadastro, o registro serve como forma de proteção e prova de anterioridade na hipótese de alguém afirmar ser o “verdadeiro” autor de uma obra. O registro serve como um certificado da existência da obra, associando-a a autor(es) e data de criação.

Lembre-se que o registro de uma obra não garante a distribuição dos rendimentos de direitos autorais aos seus autores, visto que não há ligação entre a base de dados da Biblioteca Nacional e da Escola de Música da UFRJ com o ECAD.

Então, como cadastrar uma obra musical e receber corretamente a remuneração da execução pública dela?

Primeiramente lembramos que, quem pode fazer o cadastro de uma obra musical ou de um fonograma no sistema de arrecadação e distribuição de direitos autorais no Brasil (ECAD) é o titular do direito da obra ou do fonograma.

Além disso, é importante ressaltar que ainda que a obra musical e o fonograma estejam cadastrados corretamente no ECAD, para que o titular do direito autoral ou do direito conexo receba a remuneração da execução pública é necessário que ele esteja filiado a uma das 7 associações que integram o ECAD, caso contrário, não conseguirá receber.

Como fazer o cadastro da obra?

Se a obra musical não for editada, quem pode fazer o cadastro é o seu autor, que deverá acessar o site da associação na qual é filiado, buscar o formulário de cadastro de obra, preenchê-lo com o título da obra, o seu nome e seu nome artístico e enviar o formulário assinado para a associação. Caso a obra tenha parceria, deverá informar o percentual de autoria da obra de cada um conforme combinado com o parceiro.

Caso a obra seja editada, a editora do autor é quem fará o envio do formulário contendo as mesmas informações para a associação na qual é filiada, apenas distinguindo do anterior em razão do acréscimo da informação do percentual de remuneração da própria editora livremente estipulado entre autor e editora no contrato.

Atenção! É importante que os parceiros de coautoria de uma obra musical se comuniquem no momento do cadastro para evitar o chamado cadastro em duplicidade, que ocorre quando dois titulares de direitos enviam dois pedidos de cadastro da mesma obra, sejam os dois autores, autor e editora ou editoras de diferentes autores.

Quando ocorre o cadastro em duplicidade, o ECAD bloqueia os dois cadastros e não realiza a distribuição dos valores arrecadados para aquela obra até a resolução da duplicidade, o que pode demorar até quem alguém verifique essa ocorrência.

Como cadastrar o fonograma?

É feito sempre pelo produtor fonográfico, que é a pessoa física ou jurídica responsável pela gravação, podendo ser o próprio intérprete, uma gravadora ou terceiros.

Observe que, se você for um artista independente, deverá se filiar também como produtor fonográfico na sua associação para poder cadastrar os seus fonogramas.

Para fazer o cadastro, o solicitante deverá fazer contato com a associação na qual é filiado e perguntar qual o método por ela utilizado. Atualmente há associações que permitem o cadastro de fonogramas por meio de seus portais virtuais na internet, outras orientam que o associado utilize o software SISRC e a envie o arquivo exportado pelo programa no formato “IMP” e outras solicitam que envie o formulário também gerado pelo SISRC em formato “pdf” assinado pelo produtor fonográfico.

Independente do formato utilizado pela associação, sempre constará em cada cadastro de fonograma as informações de intérpretes, músicos e produtores fonográficos.

Cada fonograma gerará um número único e exclusivo do código padrão internacional de fonogramas chamado ISRC que segue o formato abaixo:

Formato do ISRC: BR-XXX-19-00001
BR = País onde o fonograma foi gravado.
XXX = Código que identifica o produtor fonográfico (dono do fonograma).
19 = Identifica o ano de publicação.
00001 = Número sequencial automático de identificação da gravação.

Agora que você entendeu um pouco mais sobre a diferença de uma obra musical e um fonograma, quem e quais os direitos envolvidos neles e como fazer o cadastro de cada um, mão na massa!

Em breve falaremos um pouco mais sobre a arrecadação e distribuição dos direitos de execução pública para que você saiba quais as fontes de receita dessa modalidade e possa traçar a estratégia mais adequada às suas metas.


1 Fonte: http://ilom.com.br/a-musica-mais-regravada-do-mundo/; http://musica.culturamix.com/curiosidades/as-musicas-mais-regravadas-de-todos-os-tempos. Acessados em 04.01.2019.



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