Prosa & Samba

A arte e os samba de Djavan - Volume 2

quinta, 22 de setembro de 2022

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“Eu vou mudar de profissão
Eu vou ser cantor
Eu vou pro Rio de Janeiro
Num expresso brasileiro…”

trecho do samba “E que Deus Ajude” 

Entre vales e montanhas, estradas afins, eis que o Jovem Djavan sai da sua apaixonante Alagoas em busca do eldorado e com as bênçãos de Nossa Senhora dos Prazeres, o Jovem artista rumou para a capital da Bossa Nova e da MPB.

Logo após aportar na Capital Fluminense, eis que vem o seu primeiro desafio, se alocar e garantir o seu pão. As noites cariocas são um deleite para quem busca uma oportunidade e o “Beco das Garrafas” abre as portas para as seletas oportunidades.

Entre Bares e Boates, o “pequeno Mutum” solta o seu cântico encanta, logo chama a atenção dos frequentadores e seu nome se espalha rapidamente. Mas o grande desafio estava a 430 km de distância, em uma cidade repleta de fumaça e cinza chumbo, em pleno contraste  com as praias cariocas. São Paulo foi o berço escolhido para o  “Abertura - Festival da Nova Música Brasileira” no Theatro Municipal de São Paulo de janeiro a fevereiro de 1975. Ali a grande virada viria a acontecer!

O Festival trouxe um frisson, organizado pela Rede Globo de Televisão,  estavam ali reunidos os futuros nomes, que anos depois ganharam a cena nacional: Alceu Valença, Carlinhos Vergueiro, Clementina de Jesus, Ednardo, Eduardo Araújo e Silvinha, Fábio, Hermeto Paschoal, Jards Macalé, Jorge Mautner, Leci Brandão, Luiz Melodia, Walter Franco entre outros…

Acervo Rede Globo

Mas a musicalidade de Djavan não foi bem compreendida pela crítica da época! O júri do evento:  presidido por Aloísio de Oliveira, que não teve direito a voto – era formado por Marcos Valle, Diogo Pacheco, Damiano Cosella, João Evangelista Leão, Maurício Kubrusly, José Márcio Penido e Sérgio Cabral.



“Samba Inexpressivo”

Definição feita por uma crítica da época na antiga Revista Pop, sobre a musicalidade de Djavan.

Já dizia a sabedoria do poeta Belchior que: O Novo sempre vem”  mas a receptividade deste novo, causou estranheza, o público foi pego de surpresa com um novo formato de letra e ritmo deste jovem alagoano. Para muitos, a sua letra trazia complexidade e uma pitada de ousadia que para muitos apresentava a dificuldade de compreensão da sua poesia.

A canção: “Fato Consumado”, naquela noite no Theatro Municipal, foi como uma bela vernissage em um dos grandes templos de nossa cultura. 

Fonte: Acervo Nacional 

Anos mais tarde, este estilo se tornaria característica peculiar na carreira do artista, mas temos que nos atentar que toda genialidade é de difícil compreensão. 

Pois uma das maiores definições da palavra genialidade se refere: “A qualidade de quem tem uma grande capacidade intelectual”, acredito eu que toda essa notoriedade de escrita vem adornada do berço musical que sua mãe, a Sra. Virginia Viana inseriu-se em sua construção. 

Claro que as belezas naturais e toda singularidade de um povo sofrido, foram expoentes para que enriquecesse a busca por uma forma mais plural e no caso, a melhor forma para que ele pudesse derramar este conhecimento fora através da música. 

Na visão do Professor da Escola de Comunicações e Artes da USP, Ivan Siqueira em conteúdo publicado na Revista da USP em Dezembro de 2016: "Para Djavan é como se as palavras se despojassem da carga semântica em função de uma outra ordem de necessidade conectada à materialidade sonora”.

Mesmo não sendo “carioca da gema”, o poeta absorve o melhor da essência dos morros e traduz isso em canções com uma linguagem direta a este público. Logo Djavan, torna-se um nome bem aceito pelas camadas populares e hoje recebe a aclamação do público, indiferente da faixa etária. 


Na opinião do Jornalista Mauro Ferreira, Colunista do G1 e especialista em música: “Djavan é um compositor com o lastro de criatividade no qual ele possui, essa definição cabe com perfeição, ouvir e ler suas letras é como uma fonte infindável de novas palavras para nosso dicionário usual. A magnitude e a experiência que os tempos de Becos das Garrafas proporcionaram à sua construção, resultou no artista no qual temos a honra de beber de sua fonte”. 

A ótica e as palavras do Mauro, me fizeram recordar do saudoso amigo, o também compositor Dorinho Marques (1953 - 2018),que por diversas vezes comentou sobre os encontros repentinos com o jovem talento, ele costumava falar que sua musicalidade tinha um laço atemporal e que isso fazia com que as pessoas criassem um laço de admiração pela maneira com que ele se apresentava em alguns bares das noites paulistanas.

“Basta aprender sambar dobrado” 
Trecho da música “Samba Dobrado” do cantor Djavan. 

Este laço geracional, me traz aqui, hoje para escrever sobre este. Mas para elucidar melhor sobre este artista, eu convidei duas pessoas que tiveram a honra de cruzar os seus passos. Nosso primeiro convidado é o Sr. José Sérgio Machado, mas neste universo musical, ele é conhecido como Filó Machado:

“Eu tive a oportunidade nos anos 80 de conviver, gravar e tocar com ele e sinceramente se ele é o profissional que ele é, nós devemos enaltecer e reconhecer os caminhos que ele galgou.

Eu tive a oportunidade de, ao seu lado, vivenciar a noite tanto no Rio quanto em São Paulo, e ele com certeza, bebericou desta fonte para construir sua carreira.

Se o Djavan chegou onde chegou é por que ele é merecedor!

Batalhou e construiu sua carreira de forma simples, humilde e sendo esta pessoa do bem” 


Dentro de minhas pesquisas, localizei uma faixa que acredito ser a primeira composição feita por ele e gravada por outro profissional, neste caso um amigo Crooner que encantou a todos nos anos 70, seu nome: Djalma Dias. Djalma era uma das vozes que gravavam os lp 's de trilha de novelas para Som Livre na época.  A canção se chama “Desgruda”  e foi gravada pelo cantor em 1973.


Nos idos dos anos 70, com o reflexo do festival, o artista ganhou notoriedade e logo foi contratado pela ODEON, uma das grandes gravadoras da época. Então convidei o amigo Nilton Ribeiro, ex-diretor da EMI ODEON e Produtor Musical da OBI MUSIC.

“Em 1975, eu fui contratado pela ODEON e o Djavan veio a São Paulo para participar do Festival Abertura e todos nós começamos a observar o talento indescritível e a swingueira impressionante que ele apresentava neste festival. 

Ele tirou o segundo lugar com a música “Fato Consumado” e ao retornar ao Rio de Janeiro, ele assinou contrato com a gravadora Som Livre.

O seu primeiro álbum foi um sucesso, tanto que a música “Flor de Lis” é tocada em diversas versões ao redor do mundo.

Em 1978, ele foi contratado pela ODEON e lançamos o álbum “Cara de Índio", repleto de canções fantásticas e que o ajudou a propagar ainda mais o seu nome, o resultado fez com que sua agenda ficasse cada vez mais concorrida e eu era o responsável por agendar estes trabalhos, resultado nos tornamos amigos.

Em seu retorno às noites paulistanas, íamos muito ao Bixiga, visitávamos diversos bares, mas frequentamos muito o Oba Oba, Casa do Sargentelli entre outras…

Lá ele demonstrava todo seu talento e arte, era uma festa!"


Daí em diante, o artista construiu com solidez sua carreira, o samba continuou sendo sua marca principal, misturada com diversos ritmos musicais e extrapolada pela riqueza poética do artista, suas canções marcam gerações e consolidam seu nome entre os gigantes de nossa música. Mas claro, eu não poderia falar sobre o artista sem convidar este amigo que ajuda a trilhar o seu sucesso. 

Com vocês o depoimento do Produtor Musical, Paulo Calasans:


E assim encerro este material singelo em homenagem a este grande artista com um presente especial a todos vocês. Confiram a playlist com todos os sambas de Djavan, inclusive de seu novo álbum “D”.

Até a próxima!


“A vida é a arte do encontro” - Dorinho Marques


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