Historicizando as canções

A inglaterra era pequena demais para ele: Ritchie, o inglês que conquistou o Brasil

domingo, 06 de março de 2022

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Richard David Court, nacionalmente conhecido como Ritchie, nasceu no condado de Kent, na Inglaterra, em 6 de março de 1952. Tem uma formação musical no rock progressivo, formou um grupo chamado Vímana, formado por  Luiz Paulo Simas, Lobão, Lulu Santos, Fernando Gama e nosso inglês. O grupo chegou a gravar um disco intitulado “Zebra” mas foi engavetado pela Som Livre. Por desavenças, Lulu Santos deixou a banda e com isso o grupo foi desfeito.

Da direita para esquerda: Fernando Gama, Lobão, Luiz Paulo Simas, Lulu Santos e Ritchie.

Entretanto, devemos nos lembrar que Ritchie não é brasileiro, como esse inglês veio parar aqui? Ritchie conheceu Liminha e Rita Lee quando os Mutantes estavam em turnê pelo Reino Unido e com isso ele foi motivado a conhecer nosso país. 


Nesta foto podemos ver Ritchie ao lado da Rita Lee

Em 1972 foi para São Paulo, participou da banda Scaladácida, no ano seguinte se mudou para o Rio de Janeiro, foi em 1975 que ele entrou para o Vímana, como citado anteriormente. Ritchie nesse meio tempo trabalhou como professor de inglês, ensinou pessoas famosas, como Gal Costa e o já citado Liminha, que viria a ajudar o amigo com a produção de Menina Veneno.

No programa Conversa com Bial, Ritchie conta que primeiro sonhou com uma melodia e aquilo não saía de sua cabeça, ligou para Bernardo Vilhena para fazer uma letra. Em uma aula com Liminha, Ritchie conta que fez uma música e o aluno na mesma hora pede para ouvir, gostou do que tinha ouvido e decidiu ajudar o professor, nos créditos da música podemos ver Liminha creditado como baixista.

Entretanto, muitos acharam que a música não faria sucesso por Ritchie ser estrangeiro, achavam que o sotaque seria um empecilho e que não teria um visual comercial. Contudo, para a nossa alegria a CBS aceitou a empreitada e tentaria lançar essa música pop. Mas existe mais um porém nessa história, pois a CBS não tinha intenções de lançar o mais rápido possível o single de Menina Veneno.

E como naquelas histórias de cinema algum divulgador da empresa estava com uma cópia da música e levou para o nordeste, pelo relato de Ritchie no programa do Bial dá a entender que foi nas rádios de Fortaleza que a música foi divulgada, independente de qual capital do nordeste que a música “vazou”, foi um estouro, as rádios passaram a tocar a música o dia todo e as pessoas queriam comprar o disco sem ter no mercado algo oficial, a vida tem dessas coisas mesmo.

Compacto de Menina Veneno lançado em 1983

Em três semanas de lançamento o compacto vendeu meio de milhão de cópias, as rádios tocavam incessantemente Menina Veneno, que narra um eu lírico contando sobre seus desejos sobre uma mulher misteriosa:

Meia noite no meu quarto, ela vai subir
Eu ouço passos na escada, vejo a porta abrir
O abajur cor de carne, o lençol azul
Cortinas de seda, o seu corpo nu

De acordo com o jornalista Ricardo Alexandre, eu seu interessante livro “Dias de luta: o rock e o Brasil dos anos 80”, Ritchie foi o primeiro dos “novos rockeiros” a vender 1 milhão de cópias. Sucesso indiscutível, hoje sabemos que Menina Veneno é uma canção que entrou no imaginário popular, como Asa Branca, Quero que vá tudo pro inferno, Tortura de Amor e Eu vou tirar você desse lugar, sabemos que isso não é fácil mas Ritchie conseguiu.

É importante lembrar que o sucesso de Ritchie foi motivo de discussão. Como ele era inglês alguns diziam que a música dele representava o imperialismo estrangeiro em nosso país. E essa discussão não era nova, na década de 1960 o país passou por uma discussão parecida, Roberto Carlos e a Jovem Guarda eram acusados de fazerem uma música alienígena e alienada, o rock era visto como uma arma do imperialismo norte-americano e as canções dos rockeiros daquela época eram vistas como alienadas às questões políticas da época. Basta lembrar que houve uma marcha contra o uso da guitarra elétrica em julho de 1967, liderada por Elis Regina e alguns artistas da intocável “MPB”. A Jovem Guarda por fazer rock não seguia as “raízes brasileiras” e deveria ser combatida.

A discussão do que seria as raízes brasileiras pode ficar para outro texto, o que importa é que sabemos que Ritchie superou isso e não foi um artista de um único sucesso. Além de Menina Veneno ele emplacou Pelo interfone, A vida tem dessas coisas, Vôo de coração, Só pra o vento, Transas, entre outras. É um inglês que entrou para a história do Brasil e que não vai ser esquecido, as próximas gerações continuarão entoando “o mundo é pequeno demais para nós dois”. O próprio autor desse texto nem sequer nasceu na década de 1980 e desde criança conhece as músicas do homenageado de hoje, quando a música é boa, o tempo não é problema.


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