Resenha de Samba

Dona Leda 90 Anos: Memória Viva do Império Serrano

quarta, 27 de dezembro de 2023

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Sambista presenciou Escola de Samba ser fundada em sua casa.


Dona Leda e Glória ao Samba homenageiam Silas de Oliveira (2016) | Foto: Juliana Vitulskis

Ledahí Nascimento Dias, a popular Dona Leda, nasceu em 8 de abril de 1933, na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, mais precisamente no subúrbio de Vaz Lobo, no Morro da Serrinha. Na casa de sua mãe, Tia Eulália (Eulália de Oliveira Nascimento, 1908-2006), foi fundada a Escola de Samba Império Serrano, em 23 de abril de 1947. Naquele dia glorioso para a cultura brasileira, a jovem Leda estava prestes a completar 14 anos de idade e viu tudo acontecer com os próprios olhos. Já no primeiro desfile da Império, em 1948, saiu na Ala Dama da Corte, como pastorinha da Escola. Hoje, Dona Leda é a memória viva das primeiras horas do Império Serrano.

Abaixo, entrevista de Dona Leda concedida à jornalista Francisca Sousa em 2018, além de uma mensagem final de 2023 em forma de reflexão sobre os seus 90 anos.

Dona Leda, o que a senhora lembra dessa época da fundação do Império Serrano na casa da sua mãe?

Tia Eulália, mãe de Dona Leda e Matriarca do Império Serrano | Acervo Rachel Valença

"Minha casa era em frente à quadra, minha casa era em frente à sede, eu era garota nova ainda, trabalhava muito carregando água no morro, ia os artistas, né? Subiam o morro, antigamente os artistas subiam o morro, não era calçada, não tinha nada, não tinha água no morro, nós tínhamos de carregar água para lavar o morro todo, e capinar e carregar... Olha, era muito trabalho, nós lutamos muito para esse Império agora estar assim, entendeu?... A meninada toda, os rapazes, nós não podíamos entrar muito na quadra, porque éramos criança ainda, né? E o povo cantando, a minha mãe no meio da quadra, naquela empolgação, que a minha mãe... Nossa senhora, minha era aquela pessoa que... Ela dizia que o Império era filho dela, né? Então eu digo que sou irmã do Império Serrano."

Quais eram as pessoas que se reuniam na casa da senhora?

"Meu tio João, Eloy, meu ex-sogro, meu tio Molequinho, Fuleiro, meu pai, Bita que era outro meu tio. Zacarias, Manula. Era muito bom aquele tempo, sabe?"

Mestre Fuleiro e Sebastião Molequinho frequentavam casa de Tia Eulália | Acervo Rachel Valença

A sua mãe ficava no meio dos sambistas?
"Minha mãe que escolhia os figurinos antigamente. Ela ficava escolhendo os figurinos. Nós tínhamos uma ala que nós não podíamos ver a nossa roupa, não. Ela mandava fazer a roupa, isso no começo da Império. As meninas só tiravam as medidas, não viam a roupa. E era aquela roupa, né? Elas já sabiam que minha mãe tinha gosto. Era muito bom. Formava lá em cima na Serrinha, descia formada ali."

As pastoras, quem eram?
"A minha prima era a primeira porta-bandeira, Jacira Sinval. Everaldo mestre-sala. Tio João e a esposa dele, Doralice, minha tia Neném. E nós ali mais novas, né? Cantando... Era muito gostoso."

Dona Leda recebe homenagem do Samba do Sindicatis em Curitiba (2019) | Foto: Jessica Tayana de Oliveira

Mudou muita coisa dessa época pra hoje?
"Ah, mudou! mudou! mudou! hoje em dia não tem mais aquela união, hoje em dia tudo é dinheiro, não tem aquela comunhão, sabe como é que é? Eu, eu! Com as minhas primas e aquelas meninas daquela época, brincando, nós íamos pedir na rua, nós éramos mocinhas, a gente ia pedir ajuda na rua, ajuda pro Império! A gente não tirava um tostão! pessoal que dava, da Penha, Irajá. A gente ia com um envelopezinho, batia nas portas e a pessoa dava, outras não davam: “uma ajuda pro Império Serrano”, a gente levava aquele dinheirinho. Isso no início do Império. E eles, que eram os adultos, os livros de ouro no comércio de Madureira, de Vaz Lobo, da Penha, assinava e dava aquele dinheiro, aquela subvenção pro Império. E era assim... Eu sinto muita saudade, muita mesma. Era aquele Império, que tinha aquele amor, quando chegava... Império desce, poxa vida…"

O que significa o samba na vida da senhora?
"Representa muito, porque eu nasci ali. Eu me criei ali, o meu pai não era muito de samba, não, meu pai é do Jongo. Minha mãe já não era do Jongo muito. Meu pai era do jongo, do tambor. Então meu pai dizia: “meu Deus, o que é isso?”. Minha mãe não, mas dia de São José, meu pai fazia aniversário em março, 10 de março, mas dia de São José ele fazia aquela festa. Ele fazia aquela festa no morro, aquela feijoada. Meu pai todo de branco. Voltava e começava a festa na frente da quadra da Império. Minha casa era bem em frente. Casei ali também. Casei nova, com 17 anos. Casei com o filho do Elóy, né? Que era o baluarte do cais do porto, baluarte do Império. Casei com ele, depois veio filho. Sou Império de verdade."

Dona Leda na quadra do Império Serrano com o Glória ao Samba em 2015 | Foto: Juliana Vitulskis

Dona Leda a senhora completou 90 anos, manda uma mensagem pro povo do Samba
"Obrigada por vocês não esquecerem de mim. Um beijão em todos… desejo pra todos saúde, saúde, saúde, saúde, saúde… paz! o que a gente tem que ter nesse mundo hoje em dia é saúde e paz. O dinheiro não interessa, o que interessa é saúde e paz, você tendo saúde e paz, o resto a gente conquista."

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