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“Drama”, novo disco solo de Rodrigo Amarante

quarta, 04 de agosto de 2021

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Integrante da última banda de grande porte do BRock, Los Hermanos, iniciada em 1997 e, desde 2007, em recesso, com aparições grandiosas e espaçadas, Rodrigo Amarante lança seu segundo disco solo, “Drama”, após “Cavalo” (2013) e o anterior “Little Joy” (2009), com o grupo homônimo. Todos foram gravados, na maior parte, nos EUA, onde ele reside, após ter feito história no Brasil, ao lado de Marcelo Camelo (atualmente radicado em Portugal), Rodrigo Barba e Bruno Medina, o núcleo duro do Los Hermanos inicial, originário da PUC carioca. Do segmento alternativo para o mainstream (em 2019, lotaram nada menos que o estádio do Maracanã), o LH pontificou sob influencias difusas de outras bandas underground locais, como Acabou la Tequila e internacionais como Weezer e Squirred Nut Zippers. Em 2009, ao lado do mítico Kraftwerk abriu show de outra matriz dissidente, a inglesa Radiohead. Na Little Joy, ele contou com o baterista do icônico grupo americano The Strokes, Fabrizio Moretti. Além da Orquestra Imperial (ao lado de Moreno Veloso, Thalma de Freitas, Nina Becker), Amarante fez outras parcerias musicais, de Adriana Calcanhotto, Gilberto Gil e Fernanda Takai, a Devendra Banhart, Tom Zé, Lanny Gordin e Marisa Monte. Escreveu a trilha do filme “7 dias em Entebbe” e sua composição “Tuyo” emplacou na série de TV “Narcos”.

“Fiz a maior parte desse disco em casa, gravando sozinho, fazendo overdubs, mas não sem muita ajuda de bons amigos, que vieram aqui gravar, ou pintaram para me ensinar como”, escreve Amarante na apresentação, onde cita os produtores Mario Caldato Jr (“um mestre sem segredos”) e Jonathan Maia (“estava lá como engenheiro, me ensinou muita coisa”). A gravação começou no estúdio de Caldato, em Los Angeles, com “Lucky” Paulo Taylor (bateria), Todd Dahlhof (baixo), Andrés Renteria (congas) e o próprio Amarante na guitarras. “Sem portas fechadas entre nós, tudo registrado em fita”, documenta ele. “Drama” parte da faixa título, nomeada pela vocalista Cornelia Murr, tema instrumental sem letra, que esgrime densas sonoridades, atravessadas por risos e ruídos de uma platéia gravada. “Ela também fez a piada que deu nome ao disco, eu acho que foi uma piada, esse disco é fantasia, faz-de-conta, mise-en-scène”, situou Amarante. Cornelia cantou em todas as músicas onde se ouve segunda voz, e ainda pilotou um Omnichord na etérea “I can’t wait”, uma das gravadas em inglês, com efeitos de percussão de Daniel Castanheira. “Ele é um irmão para mim. Veio do Rio me visitar e tocou conga, bongô, darbuka e outros inomináveis efeitos percussivos em várias faixas”, descreve o solista.

Vocais da convulsiva “Maré” (“sorte é não querer mais que viver/ a maré que leva é a maré que traz”) tem a participação de Moreno Veloso, em cujo estúdio no Rio foram gravados. “Ele cantou comigo o refrão, apesar de que é difícil ouvi-lo na mistura final”, decupa Amarante. Como na faixa título, “Tango” prepara outro ardil para os incautos. Além de cantada em inglês (“I know the way you dance tonight”), está mais para o reggae jamaicano do que o ritmo portenho. “Tara” é uma suculenta bossa joãogilbertiana, de versos farpados (“nosso amor que era carne/ cresceu fraco do osso”) revestida de cordas (violinos, violas, cellos) providenciadas por Danny Bensi e sopros (sax tenor, trombone, trumpet, flugelhorn), de David Ralicke. “Mandei os arranjos de cordas para o grande Danny Bensi, em Los Angeles, e ele tocou todos os instrumentos de cordas do disco, com exceção da faixa ‘Drama’, que compus exclusivamente usando notas e partes de fitas de um Mellotron. Depois adicionei os efeitos da platéia e do chuveiro”, enumera ele. “Ralicke é uma grande figura e tocou todos os metais do disco, exceto os saxofones de ‘Eu com você’, que tive que gravar eu mesmo, porque a essa altura estávamos todos subitamente em quarentena”, relembra.

Foto: Eliot Lee Hazel

O álbum foi registrado entre dezembro de 2018 – quando o mundo ainda existia – e setembro de 2020, já com o planeta sob efeito deste vírus subtraído da ficção científica. Amarante dissemina sua poesia amalgamada e enigmática, de imagens eventualmente cortantes, como na contra ritmada “Um milhão” (“na selva do dinheiro/ sobrevive quem tem dente/ do meu pé o vento leva a semente/ o que ela vê só não vê quem não quer”). Bilíngüe, “Tao” (“na linha dos ombros/ nas sombras nas dobras da mão/ se foi tudo amor/ é amor o nome então”) vem encordoada por violão e desliza sua cadência pastoreada por saxes (barítono e tenor), de Ralicke. Por sua vez, Bensi pavimenta de cordas o baladão de título auto-explicativo, no encerramento do álbum, “The end”, com Amarante ao piano. A letra sublinha o inexorável: “o céu é apenas uma caminhada ao leu no inferno/ viver é cair”.

Tárik de Souza

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