Colunista Convidado

Francineth estreia solo aos 78 anos

quinta, 25 de julho de 2019

Compartilhar:

Formado por estudiosos e praticantes da matéria, o coletivo paulistano Gloria ao Samba, liderado por Eduardo Pontin e Rafael Lo Ré, tem honrado seu nome com edições de livros e discos, e uma série de shows dedicados a repertórios inéditos e selecionados das escolas cariocas, Salgueiro, Império Serrano, Portela e Mangueira - todos eles realizados no Teatro Rival, no centro do Rio. O mais recente deles, devotado à verde e rosa, em junho passado, além de convocar as pastoras da escola, Zenith, Soninha da Pedra e Guesinha (filha da lendária D. Neuma) e um de seus principais compositores de samba enredo, Helio Turco, relançou uma joia veterana, que estava retirada dos palcos, a cantora Francineth Germano.

Nascida em Santa Cruz no Inharé, Rio Grande do Norte, ela estreou aos 14 anos, na rádio Poti, de Natal, a bordo do trio de forró que formou com as irmãs. Aos 19, já disputava seu lugar ao som no Rio, no programa de calouros de Ary Barroso e na boate Au Bon Gourmet. Lá, foi ouvida por Elizeth Cardoso que a levou para cantar na Orquestra do maestro Moacyr Silva. Em 1963, Francineth gravou com ele o LP “Convite à música no. 3”, com uma das primeiras interpretações de “Garota de Ipanema”, ao lado de composições do próprio Moacyr (“Sangue quente”, com Antonio Maria), do ás do sambalanço Djalma Ferreira (“Sambadim”) e um precursor tecnológico “Amor em vídeo tape”, de seu conterrâneo potiguar Hianto de Almeida e Armando Cavalcanti. Foi considerada a melhor cantora em disco de 1963, com direito a Prêmio Cidade de São Sebastião, entregue no Teatro Municipal. Ao lado de Elizeth, Cyro Monteiro e Roberto Silva, ela participou de outro álbum marcante, “Viva o samba!” cantando sambas de quadra das escolas Mangueira, Portela, Império Serrano, Salgueiro e Unidos de Lucas. A partir de 1970, Francineth passou a integrar o coral As Gatas, que gravou com astros de A a Z da MPB. Como Chico Buarque, Luiz Gonzaga, Elba Ramalho, Ivan Lins, Simone, Clara Nunes, Beth Carvalho, Ney Matogrosso, Roberto Ribeiro, João Nogueira, Gonzaguinha e até mesmo o americano Paul Simon.. Após um período de mais de vinte anos afastada dos palcos, ela finalmente estreia em disco solo, aos 78 anos: “Francineth & Batuqueiros e sua Gente” (Independente).

Seus acompanhantes são mais um grupo paulista de (16) músicos dedicados ao samba, tanto autoral quanto de bambas como Geraldo Filme, Mauro Duarte, Candeia e Ederaldo Gentil. Já se apresentaram com Kiko Dinucci, Eduardo Gudin, Douglas Germano e Wilson Moreira. São eles: Henrique Araujo, Junior Pita, Allan Abadia (também autores de alguns dos arranjos) Marcelo Martins, Marcelinho Montserrat, Vitor Casagrande, Pedro Moreira, Tiganá Macedo, Jorge Luis Garcia, Geraldo Adriano Campos, Raphael Moreira, Alfredo Castro, Xena Barros, Sidnei da Cuíca, Rafael Toledo e Roberto Amaral. Há ainda arranjos de Nailor Proveta e João Camareiro, que participam do disco, sob direção musical de Gian Correa e Henrique Araujo. No núcleo central, dois violões de seis e sete cordas, cavaco com afinação de bandolim, cavaquinho paraguassu, bandolim, dois trombones, congas, repique de anel, cuíca, agogô, três tamborins, dois pandeiros, reco-reco e surdo. 

O abre alas do repertório é o emblemático “Império do samba” (“chegou o império do samba, agora o samba vai imperar/ ai, ai, ai, o doutor mandou todo mundo gingar”), do casal mitológico Zé da Zilda e Zilda do Zé, lançado em 1954. Francineth abre à capella e é seguida pela percussão e uma orquestração amaxixada. Na introdução de “Amor inesquecível”, a autora, Dona Ivone Lara, testemunha:

“Uma cantora de nome Francineth gostou muito da música e foi minha primeira música gravada”.

É um belo samba lento, melodioso e cadenciado ao estilo da imperiana, que também assina o notório “Nasci pra sonhar e cantar” (parceria com Delcio Carvalho), outra joia reluzente, que Francineth singra com estilo. Zeca Pagodinho divide com ela o portelense “Tal dia é o batizado” (Cabana), de irresistível final batucado, com saudações ao reduto de Oswaldo Cruz. Clássico samba canção do cardápio elegante de Elizeth Cardoso, “Nossos momentos” (Haroldo Barbosa/ Luiz Reis) celebra a madrinha de Francineth que desvela seu lado autoral em “Amor infinito” (com Guilherme Lara); lírico, entrecortado por sax e 7 cordas. O samba de protesto “Cambão”, de Luiz Vieira, que ela tinha gravado em compacto com o Banzo Trio, nos 60, ressurge atual: “Plantei arroz, plantei feijão/ trabalhei que só um boi ladrão/ a maior parte ficou com o patrão/ sou filho da terra, nasci nesse chão/ ninguém nunca mais vai me botar cambão”. Bamba de safra recente do samba paulistano, Douglas Germano fornece “Sacerdócio”, o arremate perfeito para este resgate de uma voz preciosa: “Trouxe aqui meu canto pra lhe dar/ melancolia em mim não tem lugar/ nem nostalgia, deixa o tempo andar/ eu quero é ver nascer um dia bem melhor”.

Por: Tárik de Souza


Comentários

Divulgue seu lançamento