Escambo Sonoro

Gravidade D: O Lado Grave de Djavan (Parte 2)

terça, 23 de janeiro de 2024

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O sexto álbum de estúdio é lançado e junto a isso, o uso de baterias eletrônicas, timbres de guitarra mais molhados e neon Lilás (1984) constroem a atmosfera do disco. O uso de sintetizadores inibe, de certa maneira, o uso do contrabaixo, mas ainda assim aparecem frases marcantes nas músicas. Diferente de tudo, Sizão Machado produz um Infinito sagaz de slaps e acordes na trilha da telenovela Um Sonho a Mais (TV Globo). Nas Esquinas da terceira música, o uso de notas longas junto a técnica de palm-muting — onde as notas do contrabaixo são abafadas com a mão polpa da mão direita — constroem o ambiente letárgico da canção. Sutil com uma Íris, a combinação entre sintetizadores e analógicos alcança um horizonte elegante e distinto de outras canções Lilás. Se a introdução de Capim pode ser usada para a primeira aula sobre slap, o Canto da Lira é recomendado para a próxima aula.


Completando uma década desde sua primeira gravação, Djavan chega ao seu sétimo trabalho: Meu Lado (1986). Neste disco, a mensagem de combate ao Apartheid da África do Sul é posto em cena na dobradinha Nkosi Sikelel’ L-Afrika / So Bashiya Ba Hlala Ekhaya, o Hino da Juventude Negra da África do Sul. O carro-chefe está na Asa que embala todos nós por tantos anos, além da Lei que impera no balanço das notas escolhidas a dedo e do timbre anasalado do contrabaixo reconhecido rapidamente.


Gravado em Los Angeles e lançado em outros países com o título de Bird of Paradise (1988), é o último trabalho de Sizão Machado comandando as cinco cordas da Sururu de Capote. Não é Azul Mas é Mar (1987) inicia sua viagem em Soweto — primeira “canção de protesto” de Djavan — com concisão e economia. O slap entra em cena em Me Leve e a sugestão de utilizar a canção em aulas sobre o assunto continua válida. Ainda sobre a música anterior, algumas variações da técnica são menos perceptíveis, sendo a parte B embalada por um super groove que se une ao Carnaval no Rio, com balanço garantido pelo 6/8 dançante. Sizão constroem linhas muito legais durante a sequência Navio, Maçã e Real e na última delas, de forma magistral, o supracitado peteleco sonoro se manifesta.




Homônimo ao segundo trabalho, o disco de 1989 conta com quatro baixistas. Isso mesmo! Em Djavan (1989) acontece o maior revezamento nas quatro linhas, apontando assim, a gravidade das estrelas a serem escaladas: Arthur Maia (faixas: A2, A3, B5); João Baptista (faixas: A2, A4, B3), Luizão Maia (faixas: B2) e Sizão Machado (faixas: B1). Arthur Maia, o gigante — responsável por trazer o contrabaixo para a linha de frente da música instrumental brasileira com sua Cama de Gato — é sobrinho de Luizão, o primeiro baixista a gravar em estúdio com o compositor de Maceió. Na discografia de Maia, igualmente gigante, há tanto discos solo quanto acompanhamento de: Gilberto Gil — Fé na Festa ao vivo (2010), Markú Ribas — Mente & Coração (1980); Ivan Lins — Daquilo Que Eu Sei (1981) e Amar Assim (1988); Gal Costa — Fantasia (1988); Flávio Venturini — Noites Com Sol (1994), entre outros. 


Em relação às canções, destacam-se três. O incomensurável Oceano com o fretless preciso de Arthurzinho; Corisco com uma condução implacável e Mil Vezes, na qual frases idiomáticas, falsos harmônicos e o timbre mais conhecido no universo dos graves são a bola da vez. Aqui, encontramos a prova de que ouvir o disco completo é essencial. Afinal, pode ser que grande parte do tesouro esteja na última canção.


Coisa de Acender (1992) parece melhor do que nunca com os sucessos Se e Linha do Equador vindo a público. A faixa Alívio marca a primeira parceria entre Djavan, Arthur Maia e seu preciso fretless, na qual, o contrabaixista cria contornos pra lá de criativos na canção. Os slaps em Boa Noite são super legais, dando a entender que alguém andou ouvindo como a técnica era aplicada em trabalhos anteriores. Para fechar o Baile, os harmônicos de Maia dão charme à última canção. Portanto: ouçamos os discos até o final, combinado?


Arthur Maia e Nelson Faria | Um Café Lá em Casa 


Novena (1994) é o primeiro trabalho produzido, arranjado e é claro, composto por Djavan. Para tal tarefa, o time de graves conta com Arthur Maia e Marcelo Mariano. O último deles carrega desde cedo o som nas veias, afinal, ele é filho de dois titãs da música brasileira: César Camargo Mariano e Marisa Gata Mansa. Além disso, Marcelo Mariano contribuiu no cenário nacional com: César Camargo Mariano —  Natural (1993), Emílio Santiago —  Perdido De Amor (1995), Leila Pinheiro — Mais Coisas Do Brasil (2001), Chico Pinheiro — Meia-Noite, Meio-Dia (2003), dentre outros. As canções que podemos destacar em razão das linhas de baixo são: Sem Saber por conta do groove e Quero-Quero, com um quê de João Bosco na parte A e Gilberto Gil — talvez algo da trilogia Re — no refrão. O álbum apresenta uma vinheta instrumental chamada Sete Coqueiros, um tema super divertido e coeso, sem exageros ou notas desnecessárias, assim como toda a obra de Djavan.


Ao interpretar Coração Leviano (Paulinho da Viola), Sorri (versão de Braguinha para Smile de Chaplin) e Correnteza (Tom Jobim e Luiz Bonfá) em Malásia (1996), Djavan faz algo novo em sua carreira. Embora tenha interpretado outras canções em trabalhos anteriores, cantar três sambas de compositores consagrados é algo distinto em sua discografia. Há duas pérolas no contrabaixo: Nem um Dia com o fretless acertadíssimo de Arturzinho e Deixa o Sol Entrar cujo solo merece ser degustado nota a nota.


Em Bicho Solto (1998) quem assume o contrabaixo gravou com Hamilton De Holanda — Hamilton De Holanda (2002), Ivan Lins — Acariocando (2006), Flávio Venturini — Canção Sem Fim (2006), dentre outros. André Vasconcellos conta em sua discografia solo com alguns trabalhos: Observatório (2002), Dois (2010), 2 (2011), + brasileiro (2013), +3 (2017), e o recente + Carioca  (2023). O décimo terceiro trabalho na carreira de Djavan mostra uma parceria um tanto quanto inusitada em relação ao gênero musical, mas, ao mesmo tempo, revela o lado incansável do compositor por ter uma Carta escrita em parceria com Gabriel O Pensador. O mantra repetido em parágrafos anteriores se torna verdadeiro porque Meu Bem-Querer é uma das melhores do disco. Para os amantes dos graves ficam três: Você é, Passou e Pássaro, a mais interessante em razão das frases e da condução implacável de André.


André Vasconcelos e Hamilton de Holanda 


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