MPB de A a Z

Meninão do Rio, de Copacabana, da crônica, do humor, do show, da boemia... E da música também

quinta, 16 de setembro de 2021

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A quem interessar possa: além de humorista dos mais cultuados (o seu "Festival de Besteiras" que assolava o país nos anos sessenta, na pele do pândego Stanislaw Ponte Preta, e de cronista de pena ágil e delicada com a assinatura de batismo, o bravo elegítimo carioca Sérgio Porto foi também um amante e praticante da música brasileira.

Além de compositor (bissexto, porém inspirado), assinou colunas sobre a MPB em jornais e revistas e garantiu o seu lugar na galeria dos criadores com pelo menos um samba memorável, aquele do "Crioulo Doido", Que bota a História do Brasil pra rebolar,  onde "Dona Leopoldina virou trem e D. Pedro é uma estação também".

Sergio Porto não nasceu num mês de setembro, mas morreu, num dia 30, no fatídico 1968 (em que o Brasil escureceu mais ainda com a assinatura do AI-5 que alguns tarados vivem fazendo o possível para ver reeditado). Copacabana – ou melhor, os bares, teatros e boates do bairro – era sua praia. O mar de Copacabana também era sua praia, especialmente na altura das ruas Bolívar e Barão de Ipanema, que cruzam a Leopoldo Miguez, onde morava e tinha estúdio de trabalho. Nas águas de Copacabana ele nadou muito, namorou muito, e nas areias jogou futebol com Heleno de Freitas (!), João Saldanha, Mariozinho de Oliveira, Sérgio Noronha e Humberto Teixeira.

Já pensou?

Cronista e frasista de pena ligeira e afiada, Sérgio Porto foi também um ficcionista de fino trato, o que se confirma nas páginas deliciosas de "A casa demolida", volume de crônicas com destaque para as lembranças de infância e textos dedicados aos amigos de infância e de boemia. Um livraço, onde o leitor encontra, entre outras pérolas, delicadezas do imenso e explosivo coração do autor: como esta, parida no calor da angústia com a morte súbita de uma grande parceira de copo e de palco:

"A Bochechinha chegara em casa às seis da manhã, dissera à empregada para acordá-la somente na hora de ir trabalhar. Não fora assassinada. Ninguém mataria Dolores Duran".

O mulherólogo das Certinhas do Lalau, roteirista de shows como "Brasileiro, profissão esperança", compositor, colunista de vários jornais e revistas (Última Hora, Diário Carioca e O Cruzeiro, entre tantos outros) foi, sobretudo, um narrador do dia-a-dia, ofício ao qual agregava todo o seu expansivo e poético amor à vida. Sempre o mais lido das publicações por onde passou (nos tempos em que a concorrência chamava-se, simplesmente, Antônio Maria, Davi Nasser, Nelson Rodrigues, João Saldanha, Rubem Braga...). Destacou-se como cronista de temas líricos e memorialísticos, enquanto Sérgio, ou sacana na pele de Stanislaw – nome com o qual assinou as impagáveis histórias de Tia Zulmira, dos Primos Altamirando e Rosamundo, e do insubstituível Festival de Besteira que Assola o País.

Trabalhador incansável, Sérgio Porto inventou, antes do Ziraldo, do Chico Anysio e do Nani, o dia com o dobro de horas. Impressionava aos contemporâneos com sua enorme e brilhante produção, sempre com a corda criativa esticada, até esgarçar o coração naquele ano de 1968 em que, para ele, o show realmente terminou.

Tinha apenas 45 anos de idade.

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