Tema do Mês

O surgimento do boêmio

PARTE 1: Vida e voz de Nelson Gonçalves

Sexta, 7 de junho de 2019

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“Boemia/ aqui me tens de regresso/ e suplicante te peço/ a minha nova inscrição...”

Impossível ler os versos iniciais de "A volta do boêmio" e não ouvir, imediatamente, a voz de Nelson Gonçalves ressoando com toda a sua potência e virilidade. Essa voz está marcada como uma das mais significativas – e mais populares – da história da música popular brasileira. Sem dúvida, o “Rei do Rádio” foi um dos cantores mais amados pelo público em seu tempo, e seu nome ainda ecoa no imaginário coletivo.

Com uma carreira que durou quase sessenta anos, Nelson Gonçalves entrou, saiu e voltou à moda, mas jamais conheceu o ostracismo: viveu todos os momentos da carreira com o público aos seus pés, com uma fidelidade e reverência que só os grandes intérpretes conseguem inspirar.

Nascido no dia 21 de junho de 1919, em Santana do Livramento, Antônio Gonçalves Sobral passou boa parte da infância em São Paulo, no Brás. Aos 19 anos, já casado com sua primeira esposa, começou a trabalhar como operário, inicialmente em uma fábrica de tamancos e depois em uma metalúrgica. Além disso, ainda foi garçom e treinou para ser lutador de boxe.

O desejo de ser artista, contudo, sempre esteve com ele. Apesar de taquilálico, isto é, com tendência a falar rápido demais e engolir as palavras, sempre teve jeito para o canto, e cantava em todos os lugares que ia: nas praças, casas dos amigos, batismos e casamentos. Foi num desses eventos que seu canto chamou a atenção de Sônia Carvalho, ex-cantora da Rádio Nacional e amiga da família de Elvira, então casada com Nelson. Sônia se encantou com a potência da voz daquele rapaz e mostrou a ele o caminho das pedras: corrigiu certos problemas de dicção, deu dicas de afinação, melhorou sua postura de palco e ainda lhe conseguiu um teste na rádio, onde estreou como cantor profissional em 1939. Por fim, Sônia ainda lhe batizou com o nome artístico com o qual seria conhecido por todo o país: nascia, assim, Nelson Gonçalves, o “macho brasileiro”.  

Nessa época inicial, seu estilo ainda não totalmente maduro era uma imitação de seu grande ídolo: o “cantor das multidões” Orlando Silva. E foi justamente o seu ídolo que ele veio a substituir dois anos depois, quando foi contratado pela gravadora Victor em 1942. Foi nesse ano que Nelson lançou seus dois primeiros fonogramas, dando início a uma longeva e profícua carreira discográfica.

O estrelato, no entanto, só veio mesmo em 1942, quando lançou "Renúncia", um fox-canção de Roberto Martins e Mário Rossi, que tocou em todas as rádios e vitrolas do país. O sucesso foi tanto que Nelson regravou a música em forma de samba para o carnaval de 1943.

A partir daí, ele viu, ano após ano, sua carreira decolar e ganhar cada vez mais prestígio. Até o fim da década gravou cerca de 150 canções dos mais variados gêneros.  

Mas isso ainda era pouco perto do que viria. Afinal, foi a década de 1950 que marcou o apogeu da carreira de Nelson Gonçalves, com o lançamento de canções que se tornaram verdadeiros clássicos, como "Escultura", "Atiraste uma pedra" e "Meu vício é você". A partir daí, essa voz grave e tão marcante nunca mais sairia da cabeça dos brasileiros.

Texto por: Tito Guedes

Fontes: 
BARROSO, Marco Aurélio. A revolta do boêmio: a vida de Nelson Gonçalves. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 2001
SEVERIANO, Jairo. Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade. São Paulo: Editora 34, 2008. 


Este é o primeiro de uma série de 3 textos sobre o centenário de Nelson Gonçalves, uma das maiores vozes da música brasileira . Fique ligado em todos os capítulos dessa história: 

Parte 1 - O surgimento do boêmio (lendo agora)

Parte 2 - Nelson Gonçalves e Adelino Moreira 

Parte 3  - A despedida do boêmio 

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