Colunista Convidado

“OK, OK, OK” desnuda a criação pulsante de Gilberto Gil

De Tárik de Souza – Especial para o IMMUB

sexta, 10 de agosto de 2018

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Depois de dividir a turnê “Trinca de ases” com Gal Costa e Nando Reis, Gilberto Gil reafirma seu fôlego criativo no disco solo de inéditas “OK OK OK” (Gegê/Biscoito Fino). A produção é de seu filho multinstrumentista Bem Gil, do grupo Tono. Ele relata no texto de apresentação ter recebido a incumbência da mãe (Flora Gil) de ouvir as novas músicas compostas pelo pai, entre elas a que só foi escolhida para o título no decorrer do processo.

Trata-se de uma pequena obra prima a respeito da débâcle política do país. “Já sei que querem minha opinião/ um papo reto sobre o que eu pensei/ como interpreto a tal, a vil situação. Penúria, fúria clamor, desencanto/ substantivos duros de roer/ enquanto os ratos roem o poder”. E pondera, balizado por uma cadencia intervalada: “Alguns sugerem que eu saia no grito/ outros que eu me quede, quieto e mudo/ e eis que alguém me pede ‘encarne o mito’, ‘seja nosso herói’, ‘resolva tudo’. Já os que me querem mais ativo, mais solidário com o sofrer do pobre/ espero que minha alma seja nobre/ o suficiente enquanto eu estiver vivo”. A maioria das faixas nada tem a ver com a política, apesar dos sopros musculosos de “Tartaruguê” desaguarem no refrão “anauê!”, saudação que foi utilizada no passado pelos asseclas do político integralista Plínio Salgado.

Gil traça delicadas odes aos netos, em “Sol de Maria” e “Sereno” (com coro infantil e risada do homenageado), alude aos percalços de saúde por que passou, na ode ao médico que o resgatou em “Kalil” (“gente competente no Brasil”) e trata com humor as intervenções sofridas, na bossa “Quatro pedacinhos” (“ela mandou arrancar quatro pedacinhos do meu coração/ um para saber se eu sinto medo/ um para saber se eu sinto dor/ um pra saber os meus segredos/ um para saber se eu sinto amor”).

Em “Jacintho”, ele debulha deficiências: “já sinto aqui na barriga/ mais preguiçosa a bexiga/ mais ociosos os rins/ cálculos, calos, calvície/ hora de chamar o vice/ pra assumir o poder”. Em “Yamandu”, o virtuose violonista gaúcho Yamandu Costa que participa da faixa tem sua artesania dissecada (“com seu violão ligeiro/ parece que é pressa/ mas é só suingue à beça”).

Outros convidados do disco são a cantora Roberta Sá em “Afogamento”, letra do jornalista Jorge Bastos Moreno, e João Donato, tecladista, vocal e co-autor da balançada “Uma coisinha bonitinha”, segundo Bem, “iniciada muitos anos antes, mas só concluída na véspera da gravação”. O disco fecha com o reggae “Pela internet 2”, atualização da primeira abordagem do tema, já com os mais recentes termos da tecnologia (drones, iTunes, whatsapp, instagram, waze, etc). Em seu texto, Bem Gil diz que o pai não se sentiu confortável com sua abordagem cool de produtor, a partir do violão e voz do solista, desnudando sua criação. Mas o público agradece o formato aguçado, que atesta a boa forma do artista. 



Fonte da imagem: YouTube (clipe "OK OK OK")

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