Prosa & Samba

Orgulho de ser Nordestino - Batatinha e Jackson do Pandeiro

Quarta, 7 de agosto de 2024

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Batatinha e Jackson do Pandeiro são apenas dois nomes desta constelação de talentos que nasce e floreia todo o solo do Nordeste de nosso país e nos enriquece cultural e musicalmente. 

Neste mês de agosto, celebramos o centenário do poeta Batatinha e os 105 anos do genial Jackson do Pandeiro e não teria melhor maneira de celebrar esta história do que mostrando o orgulho que temos do povo nordestino. Sejam bem-vindos!

Foto: Batatinha

“Meu desespero ninguém vê
 Sou diplomado em matéria de sofrer”
Só eu sei - Compositor: Batatinha

Nascido em Salvador, em 5 de Agosto de 1924, Oscar da Penha, em sua adolescência, talvez não tivesse ideia de que seria um “Ministro do Samba”. Criado na efervescente, literária e musical Bahia, de Jorge Amado e Dorival Caymmi, o jovem menino só ganhou a alcunha Batatinha um bom tempo depois. Oscar começou a trabalhar aos 10 anos de idade como marceneiro, mas a cada batida do prego na madeira, o barulho que ele ouvia era samba. Os sambas do poeta carioca Vassourinha se tornaram inspiração e logo o jovem Oscar passou a rabiscar e cantar seus sambas pela Baixa do Sapateiro e adjacências.

Na década de 40, aos 16 anos, ele se tornou office-boy do jornal Diário de Notícias da Bahia por indicação do compositor Antônio Maria Araújo de Morais, mais conhecido como Antônio Maria, que era diretor do Diário Associados. Logo seus sambas ganharam conhecimento do povo. Dono de uma forma de escrita similar ao poeta no qual lhe encantou, ele apresenta seus primeiros sambas com o nome de seu ídolo, numa tentativa de que gravassem seus sambas. Frustrou-se!

A sua tática acabou não funcionando, mas foi suficiente para que chegasse aos ouvidos de Antônio Maria, que se encantou com a singeleza de suas composições. 
E logo Antônio Maria lhe deu o apelido que lhe deu notoriedade: Batata. Esta gíria local significava a palavra "legal". Este elogio se tornou derivativo e, assim, Oscar se tornou Batatinha.

Foto: Batatinha e Jorge Amado / Créditos: acervo digital

Aos 22 anos, o poeta começa a estudar música com o Maestro Santo Amaro, mas a sua paixão era a batucada nas caixas de fósforos, que se tornou seu instrumento para composições.?


“Se eu deixar de sofrer, como é
que vai ser para me acostumar”
Hora da Razão - Compositor: Batatinha

Mas e a fama, o sucesso?

Bem, mesmo com suas composições sendo executadas na Rádio Sociedade da Bahia, a fama era regional. Coube ao cantor Jamelão gravar o samba “Jajá da Gamboa”. Com o sucesso desta gravação, uma jovem cantora de Santo Amaro, na Bahia, se encantou, seu nome: Maria Bethânia.

Em sua estreia, no dia 13 de fevereiro de 1965, ela inclui as canções “Diplomacia”, “Só eu sei”, composta por ele e J.Luna, e a canção “Toalha de Saudade” em seu show Opinião. Com o sucesso e a ascensão da jovem, o nome do poeta ganhou ainda mais notoriedade. Porém, viver só de música não era um privilégio que cabia a Batatinha. Agora pai de nove filhos, ele trabalhava durante o dia como funcionário público na imprensa oficial da Bahia e durante o dia como tipógrafo no Diário de Notícias. 

Em 1971, a sua admiradora Maria Bethânia canta em seu espetáculo “Rosa dos Ventos” as canções “Imitação” e “Hora da Razão”, celebrando e eternizando a obra deste genial poeta. 

O samba e os sambistas lhe acolhem e Paulinho da Viola lhe presenteia com a canção e título de Ministro do Samba. Seu grande amigo e compositor Riachão o definiu como "uma cabeça cheia de fios brancos e cada fio é uma nota musical".

Batatinha se aposentou no Diário de Notícias e seguiu batucando sua caixa de fósforo até o fim de seus dias. Sem esconder a alegria de viver e o sorriso que lhe caracterizou, em 3 de janeiro de 1997, aos 72 anos, sua caixinha se silenciou. Mas seu legado persiste, pois, afinal...

“É proibido sonhar
Então me deixem o direito de sambar”
Direito de Sambar - Composição: Batatinha


Jackson Pandeiro e a Ema que gemeu no tronco do Juremar



José Gomes da Silva nasceu em 31 de agosto de 1919, em Engenho Tanques, na Paraíba. Filho de Flora Maria Conceição e de José Gomes, a música já lhe batizou antes mesmo de nascer. Sua mãe era cantora de coco (uma dança de roda e ritmo da região Nordeste do Brasil) e seu pai era oleiro. Nas cantigas da voz de sua mãe, o menino nasceu embalado e abençoado por Santa Cecília. 

Criado em um berço humilde em uma família de baixa instrução, o jovem José nunca frequentou a escola. Foi através de sua mãe que o menino começou a pegar gosto pela Zabumba (um tipo de bumbo usado na música brasileira no qual o tocador usa o tambor em pé e usa as duas mãos enquanto toca).

Com o falecimento do seu pai, o jovem José sofre com sua família em busca de sobrevivência. As avarias do destino eram tantas que eles tiveram que furtar alimentos de sítios e fazendas em suas viagens para poderem se alimentar. Essas viagens feitas a pé fizeram com que Flora e seus três filhos (José, Severina e João), acompanhados de João Galdino, filho da irmã de sua mãe Santana, chegassem a Campina Grande (PB).

Na cidade grande, eles foram acolhidos pelo pai de João Galdino, seu Manuel, e assim começa a trajetória do jovem José.

“Zum, zum zum zum zum
Capoeira mata um”
Capoeira mata um - Jackson do Pandeiro

Logo o jovem foi atrás de trabalho e fez um pouco de tudo para poder sobreviver: ajudante de padaria, engraxate, pintor, varredor de ruas. Na ausência de uma figura paterna, é o mundo que o acolhe e o transporta para este novo universo. Rapidamente ele amadurece e entende que precisa ser o apoio de sua mãe e este chefe de família. Mas e a música?

Bem, a música continuou em suas veias. Na capital, ele conheceu o tocador de fole Geraldo Corrêa, amizade que se tornou uma parceria. Juntaram-se a eles o banjoísta Epitácio Cassiano dos Santos (o "Paizinho") e o violeiro e pandeirista Vicente Pereira da Silva, que ele já conhecia de Alagoa Grande, para tocar juntos. Nos anúncios dos alto-falantes da cidade, José encontrou a oportunidade de provar o seu talento e promover o seu trabalho. 

Ele foi convidado a substituir Caiçara, então animador do pastoril de Zé Pinheiro, bairro de Campina Grande. O sucesso foi estrondoso e ele ganhou o apelido de “Palhaço Parafuso” pelo seu jeito de dançar.

Com a parceria com Vicente Pereira, ele aprimorou o jeito de tocar pandeiro, algo que ele começou a explorar ainda na infância. Apesar da zabumba ser uma paixão, o pandeiro foi seu encanto.

Assim, ele firmou parceria com outro exímio pandeirista: Zé Lacerda. Nas noites, ele começou a se apresentar no Cassino Eldorado de Josefa Tributino, que se encantou com seu talento e logo se tornou sua madrinha artística. Rapidamente a notoriedade chegou aos ouvidos de outros artistas locais e José começou a frequentar as feiras e eventos da região. Nascia, assim, Zé Jack do Pandeiro!


Com a Segunda Guerra Mundial, Campina Grande recebeu um alto volume de pessoas. Por ser bem localizada, o seu porto se tornou um acolhedor de soldados e imigrantes. Logo a violência tomou conta do lugar e o agora Jackson migrou para João Pessoa (PB).

“O diabo quando não vem manda o secretário
 não entro nessa canoa que não sou otário”
Secretária do Diabo”, composição de Jackson de Pandeiro

Na capital paraibana, ele conheceu Benigno de Carvalho e reencontrou o amigo Rosil Cavalcanti, reafirmando a parceria dos tempos de feiras, a dupla Café com Leite, no qual foram para o estúdio e gravaram o sucesso “Sebastiana”.

O jovem Zé Jack foi contratado pela Rádio Tabajara para fazer parte de sua orquestra. Exímio tocador de diversos instrumentos, ele novamente chama a atenção por sua habilidade e o inteligente mestre Nozinho o convida para fazer parte da equipe da Rádio Jornal do Commercio. Zé Jack se transfere para Recife (PE) e ali ele comprova seu talento. Mas este apelido, na visão de Ernani Séve, então diretor de um programa da Rádio Jornal do Commercio, não caíam bem e, antes de anunciá-lo, inventou a alcunha "Jackson do Pandeiro" sem consultá-lo. Sucesso confirmado!

Porém, apenas em 1953 Jackson grava seu primeiro álbum ("Forró em Limoeiro" [Edgar Ferreira] e "Sebastiana").

O sucesso de Sebastiana o fez chegar ao Rio de Janeiro a convite da gravadora Copacabana. Naquele mesmo ano, lançou quatro discos e um LP, Jackson do Pandeiro com Conjunto e Coro. Em 1956, vieram outros sete discos de 78 rpm e outro LP (Forró do Jackson).

“A ema gemeu no tronco do juremar”
O Canto da Ema - Compositor: Jackson do Pandeiro

Jackson fez barulho na capital fluminense e logo ele chega na televisão. Foi contratado pela rede Tupi para ter um programa intitulado: Jackson do Pandeiro na Tupi. Mas ele teve uma confusão com o amigo Flávio Cavalcanti devido a um disco quebrado e uma fala infeliz e a resposta de Jackson ao então amigo incomodou a diretoria, que rescindiu seu contrato.

Nunca uma rescisão foi tão positiva: ele foi contratado pela Rádio Nacional e cravou seus sucessos para todo país: "O Canto da Ema", "Chiclete com Banana" e "Um a Um".

Os críticos ficaram abismados com a facilidade de Jackson em cantar os mais diversos gêneros musicais: baião, coco, samba-coco, rojão, além de marchinhas de carnaval. Rapidamente ele abriu caminhos para ritmos que pouco se ouvia nos rádios e televisores do país. Seu toque de jazz misturado ao ritmo nordestino e a sua facilidade na divisão rítmica fez com que se tornasse fonte de inspiração de nomes como João Gilberto. Sua discografia compreende mais de 30 álbuns lançados no formato LP. Desde sua primeira gravação, "Forró em Limoeiro", em 1953, até o último álbum, "Isso é que é Forró!", de 1981, foram 29 anos de carreira artística, tendo passado por inúmeras gravadoras. 

“Esse jogo não é um a um”
Um a Um - Compositor: Edgar Ferreira

O nobre artista teve diversos relacionamentos e não deixou filhos. Viveu até o fim de seus dias com Neuza Flores dos Anjos. Em 10 de julho de 1982, seu pandeiro deixou de ritmar, aos 62 anos.

Jackson deixou como herança sua musicalidade íntima e cadenciada, seu carisma e suas rimas habilidosas, retrato de um povo que tanto nos orgulha. 

Viva o povo nordestino, viva nossas raízes e um brinde com Chiclete com Banana!

Este material nasce não somente para celebrar, mas também para preservar a cultura de nosso país. 

“Um país sem cultura, é um país sem futuro!”
Frase do escritor baiano Itamar Vieira Filho 

Obrigado pela leitura!

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